Cubo Mágico

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Archive for the ‘Família’ Category

Sobre não ter filhos e os conselhos de estrupícios

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Eu não penso em ter filhos. Não considero a possibilidade. Desconsidero a possibilidade.

Quando admiti isso pela primeira vez, me senti um maldito egoísta que não gostaria de dividir sua grana com um rebento e que pretendia contribuir para a evolução do do mundo de outra forma, com textos e cenas, por exemplo. Com o tempo, vi que, se não toda a geração, muitas pessoas próximas também pensavam assim. E passei a não ter vergonha de divulgar (ou assumir a opinião) mesmo diante dos mais reaças da família.

Hoje, li no blog do Alex Castro que ele também está nessa. Ele teorizou sobre o assunto, num texto delicioso de tão engraçado e epifânico de tão próximo da minha opinião (impossível deixar só nas Coisas lidas, ao lado). Dois trechos:

Finalmente, depois que falo tudo isso, sempre vem um estrupício, bate no meu ombro carinhosamente e diz, com o ar bonachão de uma cassandra que tudo sabe:

Pois guarde minhas palavras, Alexandre, você pode não querer agora mas daqui a pouco vai querer… Em dez anos, vou encontrá-lo cheio de filhos…

E eu, imperturbável, pergunto se ele tem vontade de comer merda.

Bem, continuo, bonachão e vaticínico, guarde minhas palavras, você pode não querer agora mas daqui a pouco vai querer… Em dez anos, vou encontrá-lo empanturrado de cocô…

(O mais chocante da história é que todo mundo acha o meu comentário grosseiro mas consideram o absurdo que tive que ouvir a coisa mais normal do mundo. Vai entender!)

Se você vê uma criança empolgada, correndo feliz, conhecendo o mundo, descobrindo o próprio corpo, perguntando sobre o universo, e se isso te incomoda, se isso não derrete seu coração, se tudo o que você quer é que ela se comporte como uma boneca e fique calada e sentadinha, então, meu amigo, não tente vender um carro usado pra mim.

Entretanto, ter filhos é difícil. É a maior responsabilidade que uma pessoa pode se dar. Vejo idiotas procriando como coelhos sem ter a menor idéia do que se trata, dos desafios envolvidos, da importância da tarefa.

Vocês me desculpem, mas eu acho que dá muito trabalho, muita despesa e, mais importante, suga a liberdade. Ter filhos é uma viagem sem volta. A vida toda é um tempo muito longo. Eu sou responsável demais pra aceitar uma incumbência que não sei se poderei manter. E a nossa vida, a longo prazo, a gente nunca sabe como vai ser.

Admiro quem tem filhos. Acho que são pessoas mais corajosas que eu. Agradeço pelos futuros leitores, vou precisar deles. Agradeço pelas futuras belas mulheres, que não vão nem olhar pra um velho como eu, mas vão embelezar o mundo. Mas estou fora, sinto muito.

Meu, se vc gostou, leia inteiro. Se discordou completamente, mesmo assim, pense bem: talvez seu filho não mereça vc como pai ou mãe.

Written by Lucas Pretti

agosto 3, 2008 at 21:06

Tudo acaba, leitor; é um truísmo

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Dia dos Namorados é uma data imposta, comercial, que passa uma idéia de família católica e tudo o mais que o discurso coerente dos libertários dá conta muito melhor do que eu. Concordo com eles. Mas é inevitável parar para um balanço sentimental no dia 12 de junho. Por isso, impossível não recomendar um texto da revista Trip deste mês, assinado pelo escritor, dramaturgo e ator Mário Bortolotto, que mantém o blog Atire no Dramaturgo.

O pessoal da editora convidou o Mário para fazer como no filme Flores Partidas: procurar e rever antigas mulheres/namoradas com o intuito de descobrir o porquê de as relações acabarem. Idéia linda, executada mais lindamente ainda. O texto de Mário é informal, precioso, poético e cético nos momentos certos.

Ao contrário do personagem do filme, ele escolheu presentear as antigas companheiras com CDs. Daí o título do texto “Faixas riscadas”.

Veja dois trechos perturbadores:

Acho que, por mais que tenha tentado obstinadamente me relacionar bem com alguém, tenho mesmo esse jeito que muitas mulheres me esfregaram na cara entre impropérios e pratos arremessados pela cozinha: “Você quer ficar casado e levar vida de solteiro”. Quando elas dizem isso não estão se referindo exatamente a traições nem a festas infindáveis com mulheres das mais variadas etnias. Apenas a porres homéricos e intermináveis madrugadas adentro, uma solidão devastadora e uma falta de companheirismo alardeado por elas ad nauseam.

Então, sentado mortificadamente sozinho lá no chão da kitchenette ouvindo Furry Lewis, fiquei pensando que seria uma oportunidade não exatamente para acertar contas com o passado (acho isso solene demais), mas talvez resgatar velhas baladas para um iPod de última geração. E deixar as faixas riscadas tocarem, simplesmente porque, debaixo de todo o ruído, ainda é possível ouvir a canção.

Link direto aqui.

É um tanto egotrip, claro. Mas o que é a vida se não o cruzamento de viagens individualistas que, vez ou outra, dá num negócio entorpecente delicioso que chamamos de amor?

[Post relacionado: Livro antes]

Written by Lucas Pretti

junho 12, 2008 at 20:29

Publicado em Achados, Epifania, Família

Sabores perdidos ou Como a bolota se transforma em knödel

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Qual o gosto da infância? Pode ser chocolate, asfalto pintado, terra molhada ou um bom copo de sorvete bem gelado. Tem gente que ainda sente o gosto do carinho de um avô que não existe mais ou as palmadas de uma mãe que a vida acertou em tirar do caminho. Independente do que seja, ninguém além de nós mesmos sente aquele gosto como nós sentimos.

bolota.jpg

Já ouviu falar em knödel? É o gosto mais puro da minha infância. Mas a culpa não é do knödel, e sim da páprica. Palavrinhas chatas que provam a falta de criatividade de qualquer adulto, como aquele em que me transformei. Na época, knödel com molho de páprica, servidos no restaurante Juca Alemão, eram apenas “bolotas do Vovô Choppão”.

Qual o gosto da infância sentido anos depois? Pode ser chocolate amarelecido, asfalto desbotado, terra sem vida ou um bom copo de sorvete já derretendo. Qualquer que seja, a revisita à infância tem um sabor um tanto amargurado, melancólico, como os 8 anos que não voltam mais. Fecha-se o olho e por um segundo o chocolate tem a mesma pureza – e o knödel vira bolota -, mas no instante seguinte tudo já passou.

Qual o cenário da infância? Ele é turvo, etéreo, salpicado de sensações. E o cenário da infância sentido anos depois? Exato, preciso, real. Não é o mesmo, simplesmente.

Estive no Juca Alemão de novo há alguns dias e comprovei que o Vovô Choppão não existe mais (a referência infantil era ao logotipo do restaurante, um senhor alemão segurando uma caneca de chopp). O knödel está lá, mas agora custa alguns reais. As mesmas paredes estão lá, mas agora lembro delas com perfeição.

Por mais que aconteça com todos, ninguém é capaz de sentir isso. Da mesma forma que não sou capaz de fechar os olhos e viver a sua terra molhada, o asfalto pintado daquele sujeito. Só nós mesmos sentimos aquele gosto como nós sentimos.

Por um segundo.

Apenas um segundo.

Aí tudo vira real.

Written by Lucas Pretti

fevereiro 12, 2008 at 18:18

Publicado em Crônicas, Epifania, Família

No fim do ano, o futuro

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Qualquer fim de ano é inundado por retrospectivas, olhar para trás, balanços, o que foi, as 10 mais do que passou. Para terminar o ano, prefiro apontar para o futuro. A Época desta semana traz um artigo impressionante pela contemporaneidade. O jornalista Adriano Silva usa os adjetivos corretos e os cenários perfeitos para uma tese muitíssimo provável: em pouco tempo, todos seremos bissexuais. Quem não pensa assim, diz Adriano (e eu humildemente endosso), é “cafona, desinteressante, desinformado, jeca”.

Ainda não está disponível no site para não-assinantes (o link é este), por isso reproduzo abaixo:

Bissexual

Em breve, todos seremos bissexuais

Numa boa, sem estardalhaço: em uma ou duas gerações essa parede de silêncios, vergonhas, desconfianças e incômodos que há entre heterossexuais e homossexuais vai ser reduzida a uma risca quase invisível no chão. Se estivéssemos no fim dos anos 60 e eu escrevesse aqui que, em 40 anos, os conceitos de esquerda e direita, proletariado e burguesia, de explorados e exploradores não significariam mais nada, provavelmente seria metralhado. Ou pela polícia política do regime ou pelos guerrilheiros da oposição.

Da mesma forma, minha tese sobre o esmaecimento da importância da escolha sexual corre o risco de ser metralhada hoje tanto por ativistas gays quanto por machões homofóbicos. Mas é o que parece que vai acontecer. Transar com gente do mesmo sexo ou do sexo oposto não vai pesar muito nem para a aceitação social de uma pessoa nem para sua discriminação pela comunidade.

Quais os indícios de que isso vai rolar? Ligar para a opção sexual de cada um, ficar preocupado com a orientação das pessoas na cama, sala, varanda ou casinha de sapê é uma postura cafona, associada a gente desinteressante, desinformada, jeca. Ter medo da diferença que o outro nos impõe, sentir-se ameaçado ou agredido pelo que o outro faz ou deixa de fazer com seu corpo, na intimidade, com outra pessoa também é postura que remete a gente que está atrasada, uma ou duas curvas aquém dos giros que o mundo não pára de dar.

Entre meninos e meninas, mas especialmente entre elas, um dos valores mais fortes da nova geração é a liberdade para ter experiências, para tentar a mão – entre outras partes do corpo – e ver qual é. Na vida profissional, na hora das férias ou de escolher alguém para namorar. Outro valor dessa moçada é o hedonismo. Tudo tem de envolver prazer. As regras existem, mas vêm sempre a reboque das sensações, da satisfação estética, do deslumbre com uma novidade, do que pede a epiderme e do que manda a paixão. Essa turma beija um monte de gente na boca pela farra, sem compromisso, e começa a enxergar homens e mulheres não como dois gêneros estanques e bem definidos, mas como pessoas. Esses garotos e garotas vão virar adultos em dez anos. E depois vão dar à luz, com todo o seu espectro de liberalidade, uma nova geração de adolescentes.

Trazer o namorado para dormir em casa, que já não é problema para muitas meninas, vai deixar de ser problema também, logo, logo, para os meninos. E não será raro uma garota engatar um namoro firme com um rapaz e, depois, com outra garota. Afinal, ela não estará procurando o “homem”, mas a “pessoa” de sua vida, de um amor que a encante e a complete – busca que vai passar a muitos quilômetros da questão de gênero que ainda trava tanto a minha geração como as anteriores.

[Imagem retirada do site e-jovem]

[Atualização 8/01: Me mandaram o link desta notícia publicada pela BBC, que dá base científica para a teoria comportamental do Adriano Silva: Cientista italiano diz que humanidade será bissexual]

Written by Lucas Pretti

dezembro 29, 2007 at 2:36

Publicado em Contemporâneos, Família, Sex

Empanturração natalina

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ceia

Se você acessou a internet nos últimos anos ou manteve um e-mail nesse tempo, com certeza recebeu, por spam ou não, um programa chamado Churrasco Calculator (faça o download aqui). Simples: coloque lá quantas pessoas estarão no seu churrasco e ele informa o que comprar. Utilíssimo.

Agora a coisa virou natalina. Um pessoal da própria Microsoft inventou o Ceia Calculator (download aqui), que fornece a quantidade necessária de perus, amêndoas, bacalhaus e essas coisas natalinas para suprir a família toda. É realmente útil, apesar de não diferenciar uma menina magrinha-que-tem-nojo-de-comida-e-faz-‘nossa…’-quando-vê-o-seu-prato de uma que encara o rango como se deve. Aliás, a Revista TPM já falou em setembro sobre essa característica bem feminina neste artigo.

Você sabe a origem da ceia de Natal?

[Foto bem familiar retirada do álbum de nini no Picasaweb]

[Post relacionado: Natal do Brasil]

[Via Ócio 2007]

Written by Lucas Pretti

dezembro 13, 2007 at 22:10

Publicado em Achados, Família

Filhos de quatro patas

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capa galileu

Uma discussão atualíssima e que você fala “Nossa, é isso mesmo” quando vê. A capa deste mês da revista Galileu captou no ar as mudanças comportamentais contemporâneas em relação à maternidade e estampou o mais novo filho da família brasileira: o cachorro.

Quantos não são os amigos, jovens na maioria, claro, que optam pelos cães como alternativa afetiva e financeira aos filhos. Não interessa em nada para você, mas eu sou um deles, e por isso me identifiquei e indico a leitura da reportagem (link aqui para o trecho disponível na web).

O comediante Rafinha Bastos tem outra explicação para o fenômeno. Diz que cachorros não são os melhores amigos dos homens pelo companheirismo etc., mas “porque só dura 14 anos aquela merda”. Ele disse isso neste show.

Written by Lucas Pretti

dezembro 8, 2007 at 22:53

86 anos

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Acabei de mandar este scrap ao meu avô, Delpho Pretti. Hoje é seu aniversário. Fizemos tudo como de praxe – parabéns etc. E até uma espiadinha nas cinzas (ele morreu em março deste ano, mas seu Orkut continua lá).

Parabéns.

Written by Lucas Pretti

novembro 6, 2007 at 0:31

Publicado em Família

Alma e copo

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Zilhões de anos depois do “advento” (só acadêmicos falam essa palavra, vamos combinar, mas tem um significado legal, clica lá) dos comunicadores instantâneos (vide ICQ, AIM, Y! Messenger, Windows Live, GTalk) e ainda havia alguém com menos de 30 anos na face da terra não adepto do nosso correio contemporâneo.

Monise, amiga, jornalista, surtada, querida, enfim me chamou para uma quick conversinha, despretensiosa, novidades rápidas e rasteiras viajando por fibra ótica. Ela escrevendo é igual ela falando, impressionante: “Aqui temos a rua dos emos”. Podia vê-la dizer isso e completar a frase com seu sonoro e sincero Humpf. Falamos de remédios psicotrópicos, amigos gays e do ano-novo.

Quantas saudades eu sinto dessa galera, de noites de abertura e dias de fechamento. De pautas festeiras e festas pautadas. Companheiros de alma e copo.

Dizem que quem tem amigos tem tudo. Um brinde aos precisos e preciosos clichês!

Written by Lucas Pretti

outubro 25, 2007 at 5:48

Publicado em Dia-a-dia, Família

Meu avô tem Orkut

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Este aí ao lado é meu avô, o patriarca da família, Delpho Pretti. Ele faz aniversário em 5 de novembro, como o Orkut já vem me avisando desde já. Serão 86 anos dedicados à atualização constante – que o levou, no fim da vida, a ter… um perfil no Orkut (quando apenas 2,7% dos usuários têm mais de 50 anos).

Mas neste ano não poderei dar parabéns nem sentir o áspero do seu rosto semi-barbeado ao beijá-lo. Ele morreu em março. Mas o Orkut não sabe. E me trouxe boas lembranças ao destacar seu perfil.

A questão de pessoas mortas no Orkut horrorizou muita gente quando veio à tona. “Imagine enviar recados póstumos (diversos aqui), que coisa mais desrespeitosa!” Mas isso mudou com o tempo. Houve os acidentes da Gol e da TAM, diversas reportagens sobre o problema e, hoje, dá para dizer que o Orkut, além de conectar pessoas, se transforma em memorial de tempos em tempos.

No dia 5 de novembro, vou enviar um scrap ao meu avô. Ele merece um felicíssimo aniversário.

Written by Lucas Pretti

outubro 24, 2007 at 1:24

Publicado em Família, Internet